Um dia outro e mais outro
Igual ao que foi? Talvez.
Parecido com o que vem
Semelhante ao que virá
Sempre mais um cortês
Tem muita sorte
Bateram à porta
Não queria abrir
Falara-lhe a morte
Um dia vai tudo parar
Porque será? Que é que tem?
Se o dia deixar de vir
Também não vem
Quem era para ficar
Tem muita sorte
Bateram outra vez
Agarrou-lhe o braço
E foi desta vez
© Augusto Brilhante Ribeiro
Tanto mar, tanta luz, tanto sol
Vento que sopra, areia que voa
Pó que cega, pele que seca
Pensamento erguido
Passos esquecidos
O ser é saber do pulsar perdido
Tanto para dar
Mais que recebido
Estende a toalha
Deitada para o chão
Não é desistência
Faz dela um colchão
Tosta de um lado
Do outro também
Na cama que é rasa
Que é de ninguém
Fica com a pele
Parece uma brasa
O suor que sobra
Dissolve-se na água
Que fica salgada
Mais do que tem
Regressa outra vez
Besunta-lhe o corpo
Sem flacidez
Terminado o dia
A noite agitada
Na embriaguez
Da lua que é cheia
Que espera outra vez
© Augusto Brilhante Ribeiro
Serenamente. E não podia ser de outra maneira.
Repousaste. Fechaste os olhos para que não visse
As meninas dos teus olhos. Elas que se abriram,
Que se deixavam ver como eram.
Suspiraste. Oh! Como me deixaste.
Não foi assim todo o momento?
Ciúmes?
─ Do que era teu sem te pertencer.
Queixumes?
─ Do que nunca aconteceu.
Rancor?
─ Quando te dava a minha dor?
Falta de tempo?
─ Se nem da sobra aproveitaste…
Foi assim, uma vida que se perdeu.
Um permanente desencontro.
Um constante desatino com os pratos da balança.
Sem tento ficou o tempo. Sem esperança.
Mais fugidio e sem destino.
© Augusto Brilhante Ribeiro
Ai se eu pudesse apagar o choro provocado
Mudar o dia que te vi no calendário
Voltar a ter-te sempre a meu lado
Ai seu pudesse sonhar. Nem isso posso!
Sonhar os sonhos da tenra idade
Viver inocências da puberdade
Se te pudesse dizer o que sonhei
Um sonho de ternura, por ti cercado
Sem te fugir, ficar a teu lado
Ai se eu pudesse
Dava-te o amor que não tiveste
Prendia-me a ti, não te largava
Em troca do amor que prometeste
© Augusto Brilhante Ribeiro
A tua inusitada jactância
Prosternou-me pelo teu eufemismo
Estucho meu que me arrebataste
Perpetrada em réprobo sofismo
© Augusto Brilhante Ribeiro
Sorriso matreiro
Perna inquieta
Cabeça que roda
Destino certeiro
Olhar esquivo
Mirar furtuito
Um gesto de boca
Um queixo altivo
© Augusto Brilhante Ribeiro
Chove!
E que há para dizer?
Que já fazia falta?
Que não dava jeito ter chovido?
Que a perna que sempre dói, agora dói mais e é por causa da chuva?
Que as dores nas costas assim o avisaram?
Não!
Está um calor tórrido!
E que há para dizer?
Que o elevador não funciona?
Que é uma maçada subir a pé tantos degraus?
Que se ao menos houvesse um pouco de vento podia refrescar corpos suados?
Que é por causa da camada do ozono?
Não!
Há barulhos de cama a chiar!
E que há para dizer?
Que chove pra caraças?
E que agora está calor?
Não!
O que há para dizer é que:
A boazona do lado, sem pudor
Tem agora um novo amante
E o dia todo, sem parar
Só pensa em fazer amor.
© Augusto Brilhante Ribeiro
Ele disse que o tempo voava.
Ele disse que já não tinha tempo.
Levantou-se e gritou bem alto,
Porque o tempo não era só dele:
A todos fora dado um tempo.
Um tempo de estar,
Um tempo de dormir,
Um tempo de comer e depois partir;
Um tempo para ver o tempo passar.
Outro lhe disse que alguém atrasou o tempo.
Então quem o fez passaria a ficar sem tempo.
E disse ainda: - O tempo não é só teu!
Virou-lhe a cabeça.
Todos o viram.
Ficou sem tempo e depois morreu.
Depois eu disse baixinho:
- Também eu estou a ficar sem tempo.
© Augusto Brilhante Ribeiro
A vida é um sonho acordado!
Por isso vive o que sonhaste,
Para sonhares o que viveste...
© Augusto Brilhante Ribeiro